ESTAMOS DOENTES
Letícia Roxo
Nos últimos dias tenho pensado sobre
os motivos da licença saúde do governador do Estado do Rio Grande do Sul que
alegou estar estressado. Não duvido do stress do governador, no entanto
questiono a intensidade desse stress em comparação a qualquer servidor público
do Estado. A atual realidade financeira e psicológica dos servidores me parece muito mais complicada
de resolver. Afinal, o governador entra em licença e vai para um Resort
caríssimo no Costão do Santinho relaxar. E o servidor pode fazer o mesmo? Creio que não! Quando que um servidor que tem seu salário
defasado e parcelado a 21 meses, onde Banrisul lhe cobra juros em cima de
juros, onde ele deve aluguel, condomínio, luz, cartão de crédito e etc. vai
poder descansar no litoral catarinense num Resort caro? Especificamente, professores e funcionários de
escola não conseguem sequer descansar, pois todo mês é um tormento. Chegamos a
uma conclusão muito triste: profissionais da educação aqui no RS não têm
qualidade de vida, seja pela desvalorização e humilhação em que tem vivido a
quase dois anos com estes parcelamentos, falta de reajustes e aumento salarial,
seja pelas condições nas quais trabalha: escolas sucateadas, salas lotadas,
falta de infraestrutura, falta de incentivo no aperfeiçoamento educacional,
indisciplina de alunos, falta de respeito da sociedade, e por ai vai.
O artigo QUALIDADE DE VIDA DOS PROFESSORES: UM BEM PARA
TODOS de Martins Vicente Rodriguez Y Rodriguez e Joemar Braga Alves aborda o
tema da qualidade de vida dos docentes.
Relaciona a qualidade de vida a fatores como saúde, ambiente de trabalho
e motivação para a prática docente.
Os
autores identificam a desvalorização da profissão, o desrespeito do
profissional, péssimas condições de trabalho, falta de incentivo financeiro e
acadêmico, geram problemas psicológicos, psiquiátricos, cardíacos, depressão e
estresse, muito comum entre os professores.
O impedimento da profissão docente em função de adoecimento do profissional é um tema
relevante, principalmente nos dias contemporâneos, e no Estado do Rio Grande do
Sul, onde as preocupações dos profissionais com a qualidade do ensino é
culpabilizada a nós, professores, onde o ambiente e a infraestrutura de
trabalho são muitas vezes precárias, onde as políticas públicas que priorizam a
educação não são cumpridas e por fim, o desrespeito e a desvalorização do
professor, tanto pela sociedade quanto, principalmente, do governo são
constantes. O ataque de um projeto de governo que ridiculariza
a classe, parcela salários, que não cumpre com o que é estabelecido em lei e
não é responsabilizado judicialmente e, ainda, faz declarações públicas
ameaçando o servidor. Estas questões contribuem e muito para o adoecimento
psicológico e o desespero financeiro do docente. Neste contexto, os autores, na
pág. 12 citam Perrenoud e Nóvoa.
“Os problemas
vividos pelos professores”, no atual contexto da pós-modernidade, são
examinados e explorados para se tentar chamar a atenção da sociedade, de que o
insucesso escolar não é de responsabilidade única do professor, mas está
relacionado com a forma em que a sociedade atual trata a própria escola e a
educação. Nessa perspectiva, um elemento importante, reconhecido com um dos
responsáveis para desencadear e moldar o “mal estar docente”, é a falta de
apoio, as críticas, a negação de legitimidade à escola para desempenhar um
papel significativo na formação de sujeitos profissionais e cidadãos
(PERRENOUD, 1997; ESTEVE, 1999; NÓVOA, 1995).
Como
educar, ensinar, construir o conhecimento com a sociedade se não estamos saudáveis,
motivados? É necessário que a sociedade e o governo percebam que é muito
difícil melhorar a qualidade de ensino se não derem condições físicas,
intelectuais, financeiras e psicológicas, além de reconhecimento e respeito que
os profissionais em educação tanto precisam e merecem. Os autores trazem a síndrome
de “burnout” como uma consequência direta desse quadro. Onde, conforme eles, o
docente acaba desenvolvendo um stress crônico e passa a demonstrar sintomas
agressivos a sua saúde e a sua profissão.
“Está
configurada num quadro de apatia, desânimo, situação crônica de tensão
emocional e de insatisfação com o que fazem. Tem como indicadores: a baixa
produtividade do professor como consequência da síndrome; uma situação crônica
de tensão emocional, de insatisfação com o que fazem, enquanto persistem nessa
situação de desconforto e permanência no trabalho; a revelação de atitudes
negativas frente às tarefas típicas da sua função; apresentam dificuldades de
relacionamento com os colegas de trabalho e com os alunos; estão em permanente
esgotamento emocional e passam a justificar, com isso, sua apatia, sua falta de
esforço no trabalho.” (pág. 15).
Por fim, afirmam que a motivação é
um dos fatores que levam a melhoria da qualidade de vida pessoal e profissional
do ser humano. Logo a motivação atua na
busca da satisfação em ter seus interesses realizados com êxito. Isso faz com
que o ser humano encontre razão e busque realizar a suas necessidades. Essa
motivação é de diversas origens, podendo ser respeito e valorização
profissional, incentivos acadêmicos, elogios públicos, plano de carreira e
remuneração atrativa e etc.
As relações de trabalho e as
condições são determinantes para a boa ou má saúde do trabalhador, assim percebemos
que o ambiente e a relação que se estabelece entre e o meio e o professor
influência em seu comportamento e sua saúde. Desta forma, investir na qualidade
de vida do profissional da educação é se preocupar com a evolução da sociedade,
é repensar o significado de educação e concluir que saúde física, psicológica, psiquiátrica
do professor é uma necessidade social.
Portanto, estamos doentes, é fato!
Mas que a doença da categoria seja o gatilho, a faísca para exigirmos melhorias
que possam nos curar.
Por Profº Letícia Roxo
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